O Sindicato dos Professores de Campinas e Região (Sinpro) divulgou uma carta na qual contesta uma série de pontos do plano de recuperação judicial da Educação Metodista, grupo mantenedor da Universidade Metodista de Piracicaba (Unimep), apresentado à Justiça na última sexta-feira (9).
Entre os pontos com os quais entidade não concorda estão a redução de valor de dívidas maiores, a taxa utilizada para correção monetária, o prazo para quitação dos débitos e a extinção das ações trabalhistas quando o acordo for assinado.
A entidade recomendou que a categoria vote pela desaprovação do plano na assembleia de credores e também emitiu uma nota de repúdio contra ele, assinado por uma série de entidades que representam educadores no Brasil.
A Metodista, que tem como principal intenção vender imóveis para sanar as dívidas, informou que a versão inicial do plano ainda será alterada a partir de rodadas de negociações.
Veja a seguir pontos do plano que o Sinpro contesta e a posição da Metodista a respeito deles:
Quitação somente de créditos de até R$ 50 mil integralmente; os que excederem esse valor e não ultrapassarem a quantia de R$ 165 mil, sofrerão redução de 30%, e os que extrapolarem esse montante terão redução de 70%.
- Parecer do Sinpro: A entidade aponta que não foi apresentada justificativa para esta medida e que se trata de transferir aos trabalhadores os ônus da crise, “para a qual nada contribuíram”. E compara com a redução proposta para os bancos, que é de 30%. O sindicato também cita que a lei da falência prevê que os créditos trabalhistas com proposta de quitação superior a 12 meses devem ser pagos integralmente.
- O que diz a Metodista: O grupo diz que o plano de recuperação judicial foi elaborado levando-se em consideração a capacidade de geração de caixa da instituição, ativos que podem ser vendidos e a necessidade de manutenção das atividades para manter empregos e os serviços. “É preciso combinar o pagamento de todos os credores, incluindo a dívida tributária, com a sobrevivência da instituição no curto e médio prazo”, acrescentou.
Pagamento das dívidas em até 36 meses, a partir da sua aprovação, com correção dos valores a partir do segundo ano, com base na Taxa Referencial (TR), mais 3% ao ano.
- Parecer do Sinpro: O sindicato aponta que o Superior Tribunal Federal (STF) declarou inconstitucional o uso da TR para corrigir débitos trabalhistas, e que ela se encontra congelada, próxima de zero.
- O que diz a Metodista: A mantenedora afirma que os credores são soberanos para negociar e aprovar ou não o que foi proposto.
Imóveis com possibilidade de venda declarados no plano totalizam R$ 445 milhões; enquanto os créditos de todas as classes, sujeitos à recuperação judicial, já declarados, totalizam R$ 492 milhões; além de dívidas tributárias.
- Parecer do Sinpro: Para a entidade, esse cálculo gera insegurança quanto à possibilidade de pagamento de todas as dívidas.
- O que diz a Metodista: Segundo o grupo, o valor de R$ 492 milhões em dívidas não contabiliza os deságios (reduções) previstos no plano e o montante final dos débitos ainda está em apuração, “sendo certo” que “será substancialmente reduzido”. Além disso, informou que há outros bens e ativos de propriedade do Grupo Educação Metodista suficientes para o pagamento da dívida tributária.
Permissão para que, antes de iniciar o pagamento dos débitos trabalhistas, a Metodista promova a compensação de eventuais créditos que tenha com seus beneficiários.
- Parecer do Sinpro: Para o sindicato, esse ponto permite que os pagamentos aos trabalhadores ocorra nas quantias que a instituição julgar pertinente.
- O que diz a Metodista: A mantenedora aponta que o plano de recuperação ainda será alterado a partir das rodadas de negociaçõescom os credores e sindicatos. “A possibilidade de compensação nessa primeira variante do Plano de Recuperação Judicial serve para sinalizar aos credores essa perspectiva e colocar o tema em pauta, cujo aprofundamento se dará nas tratativas que se sucederão”, completou.
Pagamento de dívidas do FGTS
- Parecer do Sinpro: A entidade diz que a dívida sequer é incluída no plano de recuperação entre os valores devidos aos trabalhadores e contesta a possibilidade de aplicação do deságio (redução) dos valores do Fundo de Garantia.
- O que diz a Metodista: A Metodista comunicou que o plano diz respeito ao FGTS dos funcionários desligados e em nenhum momento prevê deságio. “Já os débitos do FGTS dos colaboradores que permanecem na instituição serão negociados de forma separada com o Fisco”, informou.
Uso do termo “em até 36 meses” na proposta de prazo para pagamento dos trabalhadores
- Parecer do Sinpro: Para a entidade, o uso da expressão permite que o pagamento seja feito uma única vez, por exemplo, apenas ao final dos 36 meses, e não mensalmente. O Sinpro também faz comparação com as dívidas com bancos e credores sem garantias (quirografários), que têm previsão de pagamento em até 24 meses.
- O que diz a Metodista: A instituição informa que o prazo de pagamento está previsto em até 36 meses, mas que há intenção de vender os imóveis no menor tempo possível para quitação das dívidas. “O prazo estendido é para, se por ventura alguma desmobilização sair fora do previsto, as recuperandas terem margem de segurança para não descumprirem a obrigação temporal assumida no plano”, acrescentou. Sobre a comparação com outros credores, sustentou que não tem base legal ou jurídica. “O Plano de Recuperação não estabelece comparações entre os credores, que são divididos por classes determinadas pela lei”.
Extinção das ações trabalhistas quando for aprovado o plano de recuperação judicial
- Parecer do Sinpro: O sindicato sustenta que tal procedimento, segundo o rito legal, somente é permitido após pagamento integral das dívidas.
- O que diz a Metodista: O grupo afirma que desde 2018 o Supremo Tribunal de Justiça (STJ) interpretou que “após a aprovação do plano de recuperação judicial pela Assembleia de Credores e posterior homologação pelo juízo competente, devem ser extintas – e não apenas suspensas – as execuções individuais até então propostas contra a recuperanda”.
O pedido de recuperação judicial
O grupo mantenedor pediu mediação judicial para acerto de débitos após fechamento de 30 cursos em Piracicaba e Santa Bárbara d’Oeste, com reflexo para cerca de 500 estudantes, devido a dificuldades financeiras.
A recuperação judicial serve para evitar que uma empresa em dificuldade financeira feche as portas. É um processo pelo qual a companhia endividada consegue um prazo para continuar operando enquanto negocia com seus credores, sob mediação da Justiça. As dívidas ficam congeladas por 180 dias e a operação é mantida.
O plano foi protocolado na Vara de Direito Empresarial, Recuperação de Empresas e Falências de Porto Alegre. O grupo aponta que a medida foi adotada para conferir mais transparência às negociações e “ganhar fôlego” para realizar uma reestruturação em sua rede.
“O plano de recuperação judicial tem como objetivo assegurar a sustentabilidade da instituição preservando a qualidade de ensino e os projetos e atividades sociais relevantes para a sociedade, como os atendimentos gratuitos nas áreas de saúde e direito. Esse é um plano sólido e objetivo, porque está baseado na venda de ativos imobiliários”, afirma o diretor financeiro da Instituição, Maurício Trindade.
Após a apresentação do plano, a próxima etapa será a publicação do quadro geral de credores pelo administrador judicial. Na sequência, será realizada a assembleia geral de credores para aprovação ou reprovação do plano.
Mudança no Fies, recessão e pandemia
A Educação Metodista afirma que está em negociação com todos os credores, incluindo os tributários. Também aponta que a crise das instituições metodistas de educação teve início com a mudança nas regras do Fundo de Financiamento Estudantil (Fies) e se acentuou com o cenário econômico de recessão dos últimos anos. “A pandemia de Covid-19 agravou a situação”, acrescentou.
“A gente vem passando por um período bastante desafiador, difícil, já de alguns anos pra cá, começando com a questão do Fies (Fundo de Financiamento Estudantil), com a questão de uma competição de mercado bastante acirrada e agora aí culminando um pouco com relação à pandemia. A situação começou a ficar cada vez mais grave, tivemos uma perda de alunos muito significativa“, relatou ao G1 Aser Gonçalves Junior, diretor de operações estratégicas da Educação Metodista, em abril.
A medida vale para 11 colégios e seis instituições de ensino superior (duas universidades, dois centros universitários e duas faculdades), que oferecem 80 cursos presenciais e 25 cursos na modalidade EAD nos estados do Rio Grande do Sul, São Paulo e Minas Gerais. A instituição emprega cerca de 3 mil funcionários, dos quais 1.200 são docentes, e atende 19 mil alunos da educação básica ao ensino superior.
Segundo Gonçalves Junior, a nova medida não vai afetar o cenário atual nos campi da Unimep na região de Piracicaba. No entanto, o instrumento jurídico reflete na organização das dívidas trabalhistas que a entidade possui com trabalhadores dessas unidades.
“Com relação à questão dos passivos trabalhistas, esses todos entram agora dentro de uma negociação ampla, dentro da recuperação judicial, onde eles vão ser endereçados, acolhidos e organizados dentro de um fluxo de pagamento possível que a gente vai ter que discutir em conjunto”, acrescentou.
De acordo com Maurício Fountoura Trindade, diretor financeiro do grupo, a classe trabalhista recebe prioridade neste processo.
Fechamento de cursos
O fechamento de 30 cursos de graduação da universidade tem reflexo em três campi, em Piracicaba e Santa Bárbara d’Oeste.
Não haverá mais aulas nas unidades de Santa Bárbara e do Centro de Piracicaba e as atividades foram concentradas em 12 cursos no campus Taquaral, também em Piracicaba.
Para os alunos as opções oferecidas foram mudar de curso ou continuar a graduação em outra instituição.
“Os alunos poderão fazer transferência interna de curso, poderão migrar para cursos EAD (ensino à distância). Também tem essa alternativa, com incentivos também, para mudar de modalidade de curso ou a alternativa de mudar para uma outra instituição”, explicou o reitor da universidade, Ismael Forte Valentin, em fevereiro.
Segundo ele, os universitários vão receber o certificado da instituição onde concluírem o curso.
Crise financeira
Os problemas financeiros da instituição tem gerado reflexos nos últimos anos. Em novembro do ano passado, professores entraram em grevealegando atrasos no pagamento de salários e de verbas trabalhistas. Sem acordo na mediação pela Justiça Trabalhista até o momento, a paralisação continua.
A universidade não informou como vai ficar a situação dos professores dos cursos fechados.
Greves
A Unimep também sofre com uma série de paralisações de funcionários devido a dívidas trabalhistas ao longo dos últimos anos. Em 2018 professores decidiram entrar em greve por conta de atrasos de salários e pela instituição não depositar o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) na época.
Em março de 2020 os funcionários da instituição também entraram em greve por conta de atrasos em salários e benefícios.
Professores entraram em greve da categoria em 30 de novembro de 2020, também apontando atraso no pagamento de salários, 13º, férias e no depósito do FGTS.
Em 5 de fevereiro deste ano houve uma audiência de conciliação entre professores da Unimep o Instituto Educacional Piracicabano (IEP), mantenedor da instituição de ensino. Contudo a reunião terminou sem um desfecho no impasse.
Fonte: G1